Autor: Roney Raimundo Leão Otilio, Procurador do Estado de Alagoas

O Novo Código de Processo Civil reservou título próprio à advocacia pública, tratando, em seus artigos 182 a 184, da representação processual dos Entes Públicos, dos prazos processuais para a Fazenda Pública e da responsabilidade civil do membro da advocacia pública.

No que interessa ao presente artigo, assinale-se que o artigo 184 traz dispositivo inovador quanto à responsabilidade do advogado público, aduzindo que “o membro da advocacia pública será civil e regressivamente responsável quando agir com dolo ou fraude no exercício de suas funções”.

O presente artigo se restringirá à análise da responsabilização civil do advogado público, âmbito no qual pode ser enquadrado o artigo 184 do Novo Código de Processo Civil. Basicamente, será analisada a aplicabilidade do dispositivo, tratando da possibilidade de sua utilização em processos administrativos.

Inicialmente, registre-se que tendo em vista a supremacia da Constituição, consequências dos requisitos mais rígidos para alteração da CF/88, bem como a constitucionalização dos direitos, não se mostra possível analisar a responsabilidade do advogado público sem que se tenha em mente as disposições previstas na Carta Magna.

Nesse passo, o art. 133 da CF/88 assinala que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Pelos termos constitucionais – “nos limites da lei” -, já é possível concluir que a imunidade do advogado público não é absoluta, dependendo de regulamentação legal.

No caso do advogado que atua no setor privado, a Lei n. 8.906/94, em seu art. 32, assinala que “o advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa”. Já no que se refere ao advogado público, até pouco tempo não havia norma específica que tratasse do tema, entendendo o STF que seria possível a responsabilização nos casos de dolo ou culpa grave e inescusável, lacuna que veio a ser suprida pelo Novo Código de Processo Civil.

Nos termos do NCPC, “o membro da Advocacia Pública será civil e regressivamente responsável quando agir com dolo ou fraude no exercício de suas funções”, garantia maior que a de um servidor público comum e da advocacia privada, que respondem por dolo ou culpa. Isso se justifica pela necessidade de uma maior independência do advogado público, na elaboração de petições e pareceres.

A primeira observação que deve ser feita em relação à norma é que, não obstante se encontre no NCPC, por certo se trata de norma de direito material, porquanto o dano processual nada mais é do que uma espécie de dano indenizável. A norma trata de tema que, a desdúvida, refere-se à responsabilidade civil, tratando do elemento subjetivo a ser exigido do advogado público para que surja o dever de indenizar.

É o que a doutrina identifica como norma heterotópica, situação em que apesar de o conteúdo da norma conferir-lhe certa natureza, encontra-se prevista em diploma de natureza distinta. Quer-se com isso dizer que a norma produz seus efeitos independentemente de estar contida no diploma processual. Se não houve qualquer restrição quanto à sua aplicação apenas aos danos ocasionados no processo civil, nada impede a sua aplicação à atuação do advogado público que atua em processos administrativos, tais como os que elaboram pareceres em licitações e contratos administrativos.

Demais disso, o NCPC trouxe capítulo próprio sobre a aplicação de suas normas, e, de forma expressa, tratou de sua aplicação subsidiária a processos administrativos, assinalando, em seu art. 15, que “na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”.

Assim, não há dúvida quanto à possibilidade de aplicação do dispositivo à atuação do advogado público em processos administrativos, sejam licitatórios ou não.

Consequência disso é que não se pode mais falar em responsabilização nos casos de dolo ou culpa grave e inescusável, como antes era externado pelo STF. Houve uma mudança legislativa e agora, por certo, o membro da advocacia pública somente poderá ser responsabilizado civilmente caso tenha agido com dolo ou fraude.

Veja-se que com a alteração legislativa, a responsabilidade do advogado público passou a ser tratada de forma idêntica à dos promotores de justiça e juízes, que também somente respondem por dolo ou fraude, conforme arts. 143 e 181 do NCPC.

Por outro lado, o art. 184 deixa claro que a responsabilidade só ocorrerá de forma regressiva, o que impede o ajuizamento de ação direta em face do advogado público, somente podendo ser acionado em ação regressiva proposta pelo Ente Público. No caso, criou-se dupla garantia: a) do advogado público, que não poderá ser réu em ação proposta por particular; b) e do Ente Público, que poderá se ressarcir caso tenha havido dolo ou fraude do agente público.

De tudo o que foi exposto, conclui-se que o NCPC inovou no tratamento da matéria, limitando a responsabilidade do advogado público apenas aos casos de dolo ou fraude, de forma regressiva, seja na atuação em processos judiciais ou administrativos.